Friedrich Schiller –
Do Sublime ao Trágico
Um dos destaques da
26ª edição da revista Cenário, lançamento da Autêntica joga luz sobre o
pensamento teórico e estético de um dos maiores nomes do Romantismo alemão.
Por César Alves
Em meados do século dezoito, a beleza
mostrou-se insuficiente para descrever o que faz da criação artística uma obra
de arte. Mais do que os valores impressos na proporção e conveniência que
convergem em delicadeza, pureza, clareza de cor, graça e elegância, a
experiência estética também exigia o desafio aos sentidos, “(...) aquilo que produz a mais forte emoção que o espírito é capaz de
sentir”, como descreve Edmund Burke em sua Pesquisa filosófica sobre a origem de nossas idéias do Sublime e do
Belo, publicado em 1759. Assim, em reação ao Belo artístico, o conceito de
Sublime ganha a atenção dos estudiosos e apreciadores das belas artes.
O Sublime, na definição de Burke, caracterizava-se
por provocar em quem aprecia um quadro ou uma obra literária emoções
antagônicas de admiração e terror. Tal conceito não era exatamente uma
novidade, tendo em vista que já havia sido proposta, séculos antes, por
Pseudo-Longino, autor de um tratado sobre o Sublime, escrito na era Alexandrina,
que circulava entre intelectuais setecentistas. O autor britânico também não
foi o único pensador da época a se debruçar sobre o tema e é na Crítica da faculdade de juízo (1790), de
Emmanuel Kant, que as diferenças entre o Belo e Sublime são definidas com
precisão.
Vem da leitura de Kant o interesse de Friedrich
Schiller pelas manifestações do Sublime na arte, objeto de alguns de seus mais
importantes escritos teóricos, publicados nas revistas Neue Thalia e Die Horen –
em parceria com Goethe – e depois revistos nas suas obras completas. O artigo Do Sublime ao Trágico, publicado
recentemente no Brasil pela editora Autêntica, está catalogado entre suas
diversas e importantes contribuições para as pesquisas e estudos sobre
estética.
Para o autor, assim como o é para Kant, a
experiência Sublime remete à natureza e nossos instintos naturais. Ao contrário
do Belo, cuja atração está ligada a um sentimento nato que nos leva ao deleite
frente ao que parece agradável e organizado aos nossos olhos, o Sublime instiga
nossa natureza física e racional. Diante do objeto Sublime, como seres físicos,
dotados de corpos frágeis que podem ser feridos por uma avalanche ou
tempestade, despertamos para nossa inferioridade frente à magnitude do mundo
natural; e, como criaturas racionais, capazes de sobrepujar e alterar a
natureza, experimentamos de uma liberdade que vai além dos limites.
Schiller também chama a atenção para a
característica diversa do Sublime em suas representações artísticas. É possível
experimentar o Sublime de forma passiva, como quando observamos o Viajante diante do mar de nuvens (1818),
de Caspar David Friedrich; ou de forma direta, tomado pelas águas ameaçadoras
que levam ao naufrágio a embarcação da cena pintada por William Turner em O Navio Negreiro (1840), exemplos deste
que vos escreve.
Segundo ele, o distanciamento proporcionado
pela reprodução em um quadro é o que faz da experiência Sublime nas artes
superior a Natureza. Como no caso do segundo exemplo, quem aprecia a cena de
Turner, uma vez distante do evento trágico, pode provar do horror do episódio e
racionalizá-lo, o que seria impossível fazê-lo estivesse ele no lugar das
vítimas ali representadas.
Ao contrário do Belo, a experiência do Sublime
não seduz e sim provoca. Apela para nossos instintos de sobrevivência e autopreservação
e, ao mesmo tempo, para nossa razão, o que torna o gosto pelo Sublime uma
característica dos espíritos mais elevados.
Serviço:
Do Sublime ao Trágico
Autor: Friedrich
Schiller
Tradução: Pedro
Sussekind e Vladimir Vieira
Editora: Autêntica
128 páginas
(O artigo faz parte da edição de número 26 da
revista Cenário, atualmente em circulação)