Alfred de Musset – A
confissão de um filho do século
Por César Alves
L´enfant Terrible do romantismo francês, Alfred de
Musset já produzia versos aos 14 anos. Seu talento precoce não passou
despercebido e logo foi aceito como o mais jovem escritor no seleto grupo de
artistas do Cénacle, salão literário
dirigido por Charles Nodier.
Embora a importância do convívio com os notáveis
tenha tido forte impacto no jovem Musset, é justamente na maneira como o autor
trata tal honraria que deixa claro sua independência criativa e indisposição
para abrir concessões.
Exemplo é o episódio que marcou sua saída da
confraria poética, envolvendo seu freqüentador mais famoso. Ninguém menos do
que Vitor Hugo.
Contrariando seus colegas, o jovem teria se
recusado a prestar homenagem ao maior dos poetas franceses, como faziam todos
ali. O que, embora possa ser visto como a mais infeliz demonstração de
arrogância e pretensão, não deixava de ser também um ato de autenticidade.
Tamanha ousadia bastaria para por fim à
carreira de qualquer poeta, mas não à carreira de Alfred de Musset.
Aos 19 anos, já era respeitado como autor dos Contos da Espanha e Itália, Pensamentos secretos de Rafael e Votos Estéreis, demonstrando
desenvoltura na composição de poemas, contos, romances e peças de teatro. Idade
também em que começa a desenvolver seu gosto pelos excessos, principalmente o
alcoolismo – que viria a matá-lo precocemente anos depois –, pela vida noturna
e pelas mulheres.
Ao longo de sua curta existência, o Musset teve
muitas paixões, mas nenhuma tão intensa quanto a que compartilhou com a poeta
George Sand – Amandine Aurore Lucile Dupin, que assinava com pseudônimo
masculino, posto que mulheres escritoras não eram aceitas pela sociedade e o
próprio meio intelectual da época.
Dotada do mesmo espírito livre do poeta, Sand
também teve muitos amantes, incluindo o compositor Frédéric Chopin, e a tórrida
paixão compartilhada entre eles rendeu rompimentos e reatamentos catastróficos
e dolorosos. Seu relacionamento turbulento teria sido a inspiração para que o
autor escrevesse A confissão de um filho
do século que, depois de muito tempo fora de catálogo, volta às livrarias
brasileiras numa bela edição da editora Amarilys.
Obra claramente autobiográfica, A confissão de um filho do século foi
publicada em 1836, três anos depois da primeira traição de Sand, com seu médico
de confiança, quando o poeta se encontrava enfermo, e depois das diversas
tentativas de reatamento, marcadas por conflitos e ataques violentos de ciúmes
de ambos os lados.
Narrado em primeira pessoa, o livro conta a
história de Otávio, jovem bon vivant,
apaixonado pela vida, mas inexperiente quanto às incertezas dos relacionamentos
amorosos e no que podem trazer de dor. Inspirado nos poetas e crente no amor
idealizado e trágico que movem os heróis românticos, como o jovem Werther de
Goethe, o personagem é surpreendido pela traição de sua amante com um de seus
melhores amigos, a quem desafia para um duelo.
Derrotado por seu oponente na peleja com
pistolas, que deveria lavar com sangue sua honra ofendida, Otávio mergulha na
depressão, provocada pela vergonha e o amor que ainda nutre por sua amante,
apesar da traição. É em busca de uma cura para a mistura de ódio irracional com
paixão e ciúme coléricos que o personagem empreende uma jornada pelas
profundezas da noite parisiense, povoada por prostitutas, poetas libertinos e
orgias etílicas.
Citado, ao lado de obras como Em busca do tempo perdido de Proust,
entre os principais romances de descoberta e marca de sua geração, A confissão de um filho do século é a
primeira de uma trinca de livros, escritos por Musset, que versam sobre a
experiência amorosa no que ela traz de sofrimento, mas também de amadurecimento
ao espírito, seguida de Noites (1837)
e Recordações (1841).
Serviço:
A confissão de um filho do século
Autor: Alfred de
Musset
Tradução: Maria
Idalina Ferreira Lopes
Editora: Amarilys
296 páginas
(Texto extraído da edição número 27 da revista
Cenário que começa a circular na próxima semana)